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Carla Canteras, Do R7

Trabalhar, ter tempo para a família e para a vida social, fazer atividades físicas, comer nos horários certos e de forma saudável são algumas das preocupações que permeiam a vida e os pensamentos da maioria das pessoas. Mas, com tanta coisa na cabeça, uma das atividades mais importantes costuma ser esquecida: dormir!

O sono é uma função vital. Posso dizer que, sem sono, não temos vida

Alan Eckeli, neurologista e especialista em sono do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto

Na sociedade atual, é comum associar o período de sono à perda de horas produtivas ao longo do dia. Um estudo do CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos), do último mês de março, mostra que um terço dos norte-americanos acima dos 18 anos relatava dormir menos de 7 horas por dia.

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Imagem criada por IA/OpenArte

Como consequência, 13,5% dos habitantes dos Estados Unidos contaram que se sentiam cansados ou exaustos frequentemente — o que derruba a teoria de que dormir é perda de tempo.

“As pessoas me perguntam: 'Como faço para dormir menos e produzir mais?' E eu respondo: quanto mais privação de sono você tiver, menos produtivo você será”, conta a professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e diretora de ensino e pesquisa do Instituto do Sono de São Paulo, a biomédica Monica Levy Andersen.

Prova disso é que qualidade do sono pode ter sido um fator determinante na seleção natural no decorrer dos séculos.

“O sono foi preservado ao longo da espécie e houve um aumento da sua complexidade, reforçando o seu papel como uma vantagem adaptativa", conta o neurologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto.

Remédios versus noites bem dormidas

O ser humano passa um terço da vida dormindo. Mas não pense você que esse tempo todo é usado apenas para descansar.

Durante o sono, acontecem algumas das principais funções restauradoras do corpo, como o reparo dos tecidos, dos músculos e das células, a consolidação das memórias e o descanso do cérebro.

“Temos a consciência da vigília, enquanto estamos acordados, e a consciência do sono. Durante o sono, concatenamos uma série de produções hormonais: aumenta a melatonina, reduz o cortisol e aumenta o hormônio GH, ligado ao crescimento. Então, é durante a noite que fazemos essa orquestração hormonal para se ter realmente um processo fisiológico adequado”, aponta o médico do sono e otorrinolaringologista da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo Danilo Anunciatto Sguillar.

Por tudo isso, fica fácil entender por que a privação do sono é tão prejudicial ao bem-estar das pessoas.

"Não adianta tomar vitamina C, comer nos mesmos horários, ter nutrição balanceada, usar o melhor creme para pele, se um terço da vida não for de um sono de qualidade e quantidade ideal", destaca Monica.

A privação de sono é pró-inflamatória, e o sono de qualidade normaliza o nosso sistema imunológico

Monica Levy Andersen, professora da Unifesp e diretora do Instituto do Sono de São Paulo

A queda da imunidade é uma das consequências de curto prazo trazidas pela privação do sono. "Os nossos anticorpos não funcionam adequadamente e não estão prontos para nos defender. Passamos a ficar mais propensos a viroses e infecções", diz neurologista e vice-presidente da ABS (Associação Brasileira do Sono), Márcia Assis.

A falta de descanso adequado causa também maior irritabilidade, oscilações constantes de humor, problemas de pele, elevação do hormônio de estresse — o cortisol — e falta de memória.

Isso sem contar os problemas sexuais, que atingem o desempenho, a vontade e a frequência.

Além dos efeitos de curto prazo, a falta crônica de sono causa danos sérios à saúde a longo prazo. Ao dormir, o corpo humano coloca em funcionamento o sistema glinfático, fundamental para a saúde das pessoas.

“Temos um líquido que banha todo o cérebro, o chamado cefalorraquidiano. Enquanto dormimos, ele penetra no sistema nervoso central e retira uma série de resíduos metabólicos, com potencial tóxico. Durante o sono, acontece de fato uma limpeza cerebral, importante para a manutenção do equilíbrio do funcionamento do cérebro”, explica o neurologista Alan Eckeli.

“Se não acontece essa limpeza, ocorre o depósito de substâncias desnecessárias, que sobraram do metabolismo cerebral, e aumenta o risco de demência”, acrescenta Márcia Assis.

O sono e a obesidade

Mais um efeito de longo prazo da falta de sono é a obesidade. Entre as atividades hormonais que acontecem durante o descanso, ao menos duas delas estão intimamente ligadas ao ganho de peso, explica Eckeli.

“Temos dois hormônios que são os mais importantes no controle da saciedade e do apetite. A grelina dá fome e leptina dá sensação de saciedade. Quando não dormimos corretamente, a grelina aumenta, e a leptina diminui. Então, comemos mais e demoramos mais tempo para nos sentirmos saciados.”

Além de aumentar a quantidade da ingestão de comida, a falta de sono faz com que a escolha dos alimentos esteja ligada ao conforto.

Nosso cérebro muda o nosso paladar para comidas hipercalóricas e de conforto. Aumenta o consumo de chocolate, carboidrato e doces

Monica Levy Andersen

Outros efeitos de privação crônica de sono são aumento dos riscos de hipertensão arterial, infarto, AVC (acidente vascular cerebral) e de desenvolver diabete tipo 2.

Além do fato de que o sono está diretamente ligado à saúde mental.

“Nos indivíduos que dormem mal ou dormem pouco, aumenta a incidência de doença, seja no espectro de transtorno de ansiedade, seja no espectro de transtornos de humor. Cresce a probabilidade de síndrome do pânico e de depressão”, destaca Alan.

Segundo a ABS, existem mais de cem distúrbios do sono, sendo a insônia e a apneia obstrutiva do sono os mais comuns. Este último foi o caso do funcionário público Edson Souza Bezerra, de 44 anos.

Alguns sintomas e a ajuda da mulher dele fizeram com que Edson buscasse uma ajuda profissional.

Os especialistas destacam que uma noite de repouso reparador deve seguir três regras.

“São três grandes dimensões: quantidade, qualidade e regularidade. Não adianta um dia ir dormir às 10 horas da noite e, no outro, às 2 horas da tarde”, diz Eckeli.

Como dormir sempre na mesma hora?

Ir para cama todos os dias no mesmo horário é um ponto de dificuldade entre as pessoas que têm rotinas cansativas. Mas os médicos ressaltam a importância desse hábito.

“Tenho que fazer um ritual, não é ir para a cama porque eu preciso dormir, fecho os olhos e durmo. O sono pode ser alcançado dando pistas para que o nosso organismo entenda que está na hora de dormir”, conta o médico do sono Sguillar, da BP.

Um dos segredos para criar um ritual é fazer a higiene do sono. O R7 destaca sete dicas para você conseguir esse objetivo.

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Arte R7
Como descobrir se eu durmo bem?

Um bom termômetro para avaliar se a sua quantidade de sono está sendo suficiente é observar como você se sente ao longo do dia.

"Se acorda de manhã e está cansada, se não tem a sensação de sono reparador, se sente fadiga ao longo do dia, principalmente após o almoço, se precisa de um cochilo por volta das 18, 19 horas, as coisas não estão no caminho certo", orienta Sguillar.

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Imagem criada por IA/OpenArte

Outro inimigo do sono saudável é o despertador.

“Se você acorda de manhã com o despertador, já é um indicativo de que não tem um sono de qualidade. Tem que dormir até o sono acabar. O sono tem de dizer ao cérebro: chega, não quero mais, agora eu quero acordar”, ressalta a professora da Unifesp Monica Andersen. 

Para descobrir como acordar sem a ajuda do aparelho, é necessário saber quanto cada pessoa precisa dormir diariamente. Lembrando que “cada habitante do planeta Terra tem uma necessidade de sono”, frisa a biomédica.

Quantas horas eu preciso dormir por dia?

A máxima de que todo mundo tem de dormir entre 7 e 8 horas por dia não é tão correta assim. “A maioria das pessoas precisa entre 7 e 8 horas”, explica Monica.

Há ainda outros grupos: os pequenos-dormidores, que ficam bem após 5 ou 6 horas de descanso, e os grande-dormidores, que necessitam de 9 a 10 horas de sono.

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Arte R7

As horas de sono podem acontecer em uma fase longa ou em duas fases distintas, sendo um período prolongado noturno e outro pequeno durante o dia.

Os médicos alertam que a ideia de dividir o descanso em várias partes do dia não é boa.

“Se começamos a dormir em três, quatro, cinco fases, é prejudicial. O organismo não está preparado para isso e haverá as consequências da queda da qualidade do sono”, afirma o neurologista e especialista em sono Alan Eckeli, do HC da USP de Ribeirão Preto.

A sugestão é "respeitar o sono para poder produzir melhor, estar bem, ter bom convívio social, poder dirigir com segurança, poder se alimentar com consciência. A ideia é construir hoje para evitar problemas no futuro", conclui a neurologista Marcia Assis. 


Diretora de Conteúdo Digital e Transmídia: Bia Cioffi
Reportagem: Carla Canteras
Coordenação de Arte: Adriano Sorrentino
Arte: Sabrina Cessarovice e Aldo Silva
Gerente de Produção Audiovisual:
 Douglas Tadeu
Coord. de Vídeo e Prod. de Conteúdo: Danilo Barboza
Operação de Captação Audiovisual: Guilherme Cabral
Produção Audiovisual: Denise Marino e Júlia Vizioli
Edição e Finalização: Caique Ramiro