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Bruno Menezes, Ezequiel Fagundes e Pablo Nascimento, da Record Minas

Cinco anos após o rompimento da barragem da mina de Córrego do Feijão, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, parentes de três das 270 vítimas da tragédia ainda aguardam notícias sobre os corpos que foram soterrados pela lama, no dia 25 de janeiro de 2019.

As buscas ainda continuam. Mesmo com os parentes já identificados, algumas famílias optaram por esperar que outros segmentos sejam encontrados para realizar um enterro digno e colocar fim a uma angústia completa 1.826 dias nesta quinta-feira (25).

Quando a tragédia completou seis meses, o R7 Estúdio trouxe o especial À Procura dos 22, com o retrato das buscas pelos 22 desaparecidos na época. Quatro anos e meio depois, a reportagem voltou à cidade para entender o luto em que as famílias ainda vivem à espera da Maria de Lourdes, da Nathália Oliveira e do Tiago Mateus.

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Reprodução / Record Minas

Na operação de buscas, o Corpo de Bombeiros se refere aos não encontrados como 'joias'. A procura por elas desperta nos familiares ansiedade, saudade e um sentimento de busca por Justiça. É um abraço que não pode ser dado, uma ligação telefônica que não se completa e um “bom dia no trabalho” que não pode mais ser desejado.

Tiago era engenheiro na Vale (Reprodução / Record Minas)

Tiago era engenheiro na Vale

Reprodução / Record Minas

“Já são cinco anos de espera. Cinco anos de muito sofrimento. Cinco anos esperando o telefone tocar. Imagina acordar e dormir com esperança do telefone tocar? Imagina esperar cinco anos por identificação? Quanto tempo mais de busca para ter uma identificação?", questiona a técnica de enfermagem Lúcia Mendes, mãe do engenheiro mecânico Tiago Tadeu Mendes da Silva, uma das três vítimas ainda sem identificação.

Lúcia defende o fim da operação de buscas, que acontece sete dias por semana. Para ela, a espera de uma notícia mantém aberta uma ferida que precisa ser cicatrizada.

“Eu suplico que parem com as buscas e construam naquele local um parque arborizado, onde possamos fazer nossas orações. Meu filho está com Deus, longe da maldade do homem. Não aguento mais andar pelas ruas da cidade e escutar sobre a  indenização, mortes e dinheiro. Nunca escutei ninguém falando qual vai ser o destino da mina Córrego do Feijão [após as buscas]", lamenta.

Já as outras duas famílias querem a continuidade dos trabalhos, conforme explica Patrícia Borelli. A mãe dela, a corretora Maria de Lurdes da Costa Bueno, então com 59 anos, também é uma das três joias.

Malu, como era conhecida, era do interior de São Paulo e estava em Brumadinho em férias. O enteado queria conhecer o Instituto Inhotim, um dos maiores museus a céu aberto do mundo. Hospedada na Pousada Nova Estância, a corretora acabou soterrada pela lama.

Maria de Lurdes era turista e estava na pousada levada pela lama (Reprodução / Record Minas)

Maria de Lurdes era turista e estava na pousada levada pela lama

Reprodução / Record Minas

Patrícia mora nos Estados Unidos. Mesmo de longe, faz questão de acompanhar as notícias sobre as buscas e tudo o que remete à tragédia. Quando se fala na mãe, ela lembra do sorriso marcante, da alegria, da força e da habilidade de ajudar as pessoas com os problemas sem qualquer tipo de julgamento.

“Para nós [as buscas] é uma questão de reparação. É uma questão de devolver as coisas para onde elas pertencem. Minha mãe não vai voltar, mas é horrível pensar que ela está lá fisicamente. Algumas vítimas são consideradas oficialmente encontradas, mas as famílias optaram por não fazer a cerimônia porque o segmento encontrado era muito pequeno. As buscas são bem maiores do que somente para as três vítimas que precisam ser identificadas ”, desabafa.

O trabalho do Corpo de Bombeiros acontece sete dias por semana. Desde o rompimento, as atividades só foram suspensas duas vezes: uma devido à pandemia de Covid-19 e outra após um forte temporal que atingiu a cidade.

A reportagem acompanhou um dia completo das operações, do despertar dos militares até o anoitecer. Assista abaixo os detalhes sobre o funcionamento dos trabalhos, conheça áreas extremamente restritas da base e conheça de perto o local onde ficava a barragem B1:

Saudade de estar perto

Com carinho e ainda em lágrimas, Tânia de Oliveira se lembra do quanto ela e a prima, Nathália de Oliveira Porto Araújo eram inseparáveis. Aos 25 anos, a jovem havia cursado técnico em mineração e estava realizando o sonho há muito tempo perseguido: estagiar na mineradora Vale. Ela é a terceira joia ainda não encontrada.

“Tudo me faz lembrar dela. Até hoje eu não tenho coragem de ir à igreja, porque me lembra muito ela, de estar presente ali, do meu lado" relembra emocionada.

Nathália era estagiária na Vale (Reprodução / Record Minas)

Nathália era estagiária na Vale

Reprodução / Record Minas

As primas eram vizinhas e se viam todos os dias à tarde. Tânia lembra que segundos antes do rompimento da barragem, Nathália estava próxima a uma árvore, dentro da área da mineradora, falando ao telefone com o marido.

“Eu liguei pra ela, mas o telefone já estava dando fora de área. Foi quando eu liguei para o Jorge, o marido dela. Ele não estava atendendo porque estava no telefone com ela pouco antes. Na ligação com ela, a Nathália chegou a dizer a frase: ‘Deus me dê o livramento’. Foi quando a ligação caiu e ele percebeu que algo tinha acontecido”, relata Tânia.

A família tem ciência de que não há pedidos de desculpas, palavras e muito menos dinheiro que possam fazer com que as primas voltem a ter os bons momentos de antes, mas espera por Justiça.

“A minha esperança é de vê-los presos. Eles sabiam o que estava acontecendo. Somos 270 famílias, somos humanos e estamos sofrendo com isso. Será que o dinheiro fala mais alto?", lamenta.

O tenente Felipe Rocha, do Corpo de Bombeiros estava na primeira equipe terrestre a chegar ao local da tragédia, em janeiro de 2019. No podcast a seguir, o agente relembra o cenário de guerra encontrado no local. O militar ainda revela como ele e a família foram afetados outra barragens dias depois. Ouça abaixo:

Córrego do Feijão

Falta o mercadinho, a movimentação, a conversa de portão e principalmente as pessoas. A sensação de quem ainda mora em Córrego do Feijão, distrito de Brumadinho, é que a comunidade virou um verdadeiro “distrito fantasma”. Antes do rompimento da barragem, 550 famílias moravam no local. Hoje, são 130 e algumas ainda estão em negociação para se mudarem da região.

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Ezequiel Fagundes / Record Minas

Moradora do distrito desde que nasceu, Eva Lúcia Barbosa, de 54 anos, sente falta da rotina pacata da comunidade. Com a tragédia, ela perdeu sete familiares, dentre sobrinhos e primos, fora os amigos. A mãe dela também morreu cerca de cinco meses depois, após ser diagnosticada com depressão.

“O lugar não é o mesmo, não tem morador antigo. Virou um deserto. A gente tem um mercado hoje aberto pela Vale, mas de antigamente não tem mais nada. Tenho saudade dos tempos que a gente viveu aqui. Virou um povoado que não tem mais nada no fim de semana, nem durante a semana”, lamenta.

A Vale afirma que executa um processo de ressignificação da comunidade que "busca promover a melhoria da qualidade de vida e o fortalecimento da economia, em diálogo com o empreendedorismo social". "No começo de 2023, os moradores voltaram a se encontrar nas ruas da comunidade, após a entrega da Praça 25 de Janeiro, do Mercado Central Ipê Amarelo, do Centro de Cultura e Artesanato Laudelina Marcondes e de duas cozinhas comunitárias, construídos pela empresa", declarou.

Assista abaixo os bastidores das gravações na Mina Córrego do Feijão em um vídeo em 360º/realidade virtual. Para uma melhor experiência, veja o material pelo celular, no Youtube, usando óculos de realidade virtual.

Justiça

A tragédia completa cinco anos com o processo criminal sem perspectiva de julgamento final. Dos 16 réus na Justiça, pelo menos um ainda não foi citado.

O procurador da República Bruno Nominato, do MPF (Ministério Público Federal) em Minas Gerais revela que todo o caso está sendo traduzido para o alemão para, enfim, tentar notificar o então gerente da consultora Tüv Süd, empresta que atestou a estabilidade da barragem antes do rompimento.

Responsável pelo laudo que atestou a estabilidade da barragem, Chris-Peter Meier já teve um pedido de prisão solicitado e seu nome chegou a ser incluído na lista de procurados da Interpol. Ele nunca quis colaborar com a investigação. Agora, a missão das autoridades brasileiras é encontrá-lo na Alemanha para dar prosseguimento a fase de instrução do processo e evitar futuros pedidos de nulidade.

"A citação normal é feita pelo oficial de Justiça. O oficial se desloca até o endereço do acusado e tenta notificá-lo do processo. Quando o acusado está no exterior é necessário um procedimento que se chama carta rogatória. Ou seja, tem que se expedir um documento para a autoridade do país estrangeiro para que a autoridade do país estrangeiro faça essa diligência, dê ciência que ele é acusado, que existe um processo em desfavor dele para que ele possa oferecer a sua defesa. As citações no exterior tem um complicador por causa disso. Não é algo que depende da Justiça brasileira", explicou o procurador.

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Arte / R7

Procurada, a Tüv Süd ainda não respondeu a reportagem sobre os questionamentos.

Outro ponto causador de indignação entre os parentes das vítimas é a possibilidade do então presidente da mineradora Vale, Fabio Schvartsman, ser retirado do processo. Ele alega que não existe nos autos qualquer ato ou omissão que possa lhe incriminar. Ele já tem um voto favorável na Justiça Federal para não ser julgado. O R7 entrou em contato com o defensor Schvartsman, mas não obteve retorno.

Por meio de nota, a Vale declarou que segue comprometida com a reparação de Brumadinho, "priorizando as pessoas, as comunidades impactadas e o meio ambiente".

A empresa afirmou que desde 2019, mais de 15,4 mil pessoas fecharam acordos de indenização. A companhia eliminou 13 barragens a montante, com a conclusão de mais de 40% no Programa de Descaracterização e tem apoiado projetos para a  diversificação da economia na região impactada.

A mineradora disse ainda que dentro do Acordo Judicial de Reparação Integral (AJRI), a Vale executou, até o momento, 68% dos R$37,7 bilhões previstos.

"A Vale reafirma seu respeito às famílias impactadas pelo rompimento da barragem e segue comprometida com a reparação dos danos, o que vem avançando de forma consistente e nas bases pactuadas no acordo judicial de reparação integral e em outros compromissos firmados para indenização individual, todos com participação de instituições de justiça", ressalta.

"Com relação ao julgamento criminal, após decisão e determinação do Supremo Tribunal Federal, a denúncia foi recebida pelo órgão judicial competente em janeiro de 2023, e o processo segue seu curso regular. A Vale reforça que, desde o início das investigações, sempre colaborou com as autoridades e continuará colaborando", completou em nota.


Reportagem: Bruno Menezes, Pablo Nascimento e Ezequiel Fagundes
Imagens: Evandro Zanitti
Drone: Fernando Prates
Edição de vídeo: Gustavo Lucas
Arte: Adriano Sorrentino
Chefia de redação em Minas Gerais: Adriana Viggiano e Flávia Martins y Miguel
Direção de jornalismo em Minas Gerais: Marco Nascimento
Direção de Conteúdo Digital e Transmídia: Bia Cioffi