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Maria Cunha*, do R7

Há aproximadamente 4,5 bilhões de anos, era formada a Lua, o único satélite natural da Terra e o quinto maior do Sistema Solar. Os estudos sobre esse astro começaram há séculos como forma de levantar hipóteses para as dúvidas de filósofos e cientistas durante suas observações noturnas.

A Lua já foi retratada em pinturas nas paredes de cavernas, esculpida em rochas e descrita por diversos povos antigos. Os egípcios e mesopotâmios, por exemplo, conheciam o ciclo das fases lunares e sabiam estimar quando ocorreriam os eclipses, fenômeno que intriga as pessoas até hoje.

Na opinião de Rodolfo Langhi, coordenador do Observatório de Astronomia da Unesp (Universidade Estadual Paulista), a curiosidade pela Lua se deve ao fato de ela ser o astro mais próximo do nosso planeta e, por isso, o mais fácil e menos custoso de ser alcançado em comparação com outros corpos do Sistema Solar. O satélite natural está a 384,4 mil km do planeta Terra, mas, a cada ano, se afasta 3,78 cm.

A possibilidade de cruzar a atmosfera e chegar a um lugar desconhecido, porém muito estudado, fez a Lua ser alvo de disputas entre países. O confronto indireto entre Estados Unidos e União Soviética, durante a Guerra Fria, fez surgir uma corrida espacial que resultou em grandes feitos e conquistas para a humanidade.

Em 2023, pouco mais de meio século após a bem-sucedida missão Apollo 11, que levou três astronautas até a Lua, o ​​programa Artemis será pioneiro ao colocar a primeira mulher e a primeira pessoa negra na superfície lunar.

Qual é a origem da Lua?

Existem diversas teorias sobre a formação da Lua. De acordo com Langhi, a mais aceita delas é a da colisão.

"​​Há bilhões de anos, enquanto os planetas ainda estavam se formando no Sistema Solar, por meio de material e rochas se juntando e aglomerando, acredita-se que outro objeto, mais ou menos do tamanho da metade da Terra, colidiu com o nosso planeta e arrancou dele um pedaço. Esse pedaço formou o que hoje é a Lua", explica o especialista. 

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Thomas Saint-Cricq, Maria-Cecilia Rezende/AFP - 9.1.2017

Essa versão é plausível e defendida por muitos estudiosos, mas há outras explicações para o surgimento da Lua, como a teoria de coacréscimo, a teoria da captura e a teoria da fissão.

“A teoria de coacréscimo diz que a Lua se formou ao redor da Terra logo quando se deu a formação do nosso Sistema Solar. Depois da formação do nosso planeta, teria sobrado material que ficou gravitando em volta da Terra e, com o tempo, acabou se aglomerando e formando a Lua”, diz o pesquisador e proprietário do Observatório Espacial Heller & Jung, Carlos Fernando Jung.

Já a hipótese de que o satélite natural surgiu a partir de uma captura, segundo o pesquisador, admite que a Lua teria se formado longe da Terra, mas sido atraída pela força gravitacional do planeta ao passar por perto dele.

“A teoria da fissão diz que a Lua e a Terra seriam inicialmente um corpo só, e o astro teria se soltado do planeta”, diz Jung.

As características da Lua
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Observatório Espacial Heller & Jung - Arquivo

Diferentemente do que muitas pessoas podem pensar, é possível ver a Lua da Terra não porque uma luz branca e intensa é emitida. Na realidade, os raios solares se refletem na superfície lunar e chegam até aqui.

Essa dinâmica da luz somada com a órbita do satélite ao redor da Terra e também do Sol resulta na forma como a Lua vai brilhar no céu e produzir as quatro principais fases do astro: nova, crescente, cheia e minguante.

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Observatório Espacial Heller & Jung - Arquivo

Um ciclo completo da Lua, ou seja, um dia lunar, equivale a aproximadamente 29,5 dias terrestres. Além de o dia ser muito mais longo por lá, há outro ponto curioso: a diferença do campo gravitacional em comparação com o da Terra.

A força da gravidade da Lua é seis vezes menor em comparação com a da Terra. Isso significa que tudo fica menos pesado e, por isso, os astronautas conseguem dar pulos que seriam impossíveis na Terra até para uma profissional de atletismo.

“Uma pessoa que pesa 100 kg na Terra pesa 11,09 kg na superfície lunar. Assim, o nosso peso na Lua é menor”, conta Jung.

Uma peculiaridade menos lembrada é a ausência de vento. Isso faz com que, mesmo após 53 anos, itens como a bandeira deixada pelos americanos e até as pegadas de Neil Armstrong na Lua permaneçam preservados.

Eclipse e superlua

Não apenas o brilho causa admiração como também a ausência da luz da Lua desperta curiosidade. O eclipse lunar ocorre quando a Terra está posicionada entre o Sol e a Lua e o satélite fica na zona de sombra. Já o eclipse solar acontece quando a Lua está posicionada entre a Terra e o Sol e o astro é temporariamente encoberto pelo satélite.

Outro fenômeno que envolve o satélite natural da Terra é a superlua, momento em que o astro chega à fase completa ao mesmo tempo em que está na posição de sua órbita mais próxima da Terra.

Existem diversas superluas ao longo do ano, as quais são nomeadas em razão dos momentos em que surgem. A Superlua de Morango, por exemplo, recebeu esse nome por aparecer durante a fase de colheita desses frutos nos Estados Unidos.

Já o nome Superlua dos Cervos foi dado porque os chifres desses animais terminam de crescer em julho nos EUA, quando ela ocorre. Outro caso é a Superlua de Esturjão, fenômeno que ocorre em agosto e que recebeu tal nome em razão de o peixe ser muito encontrado nesse mês.

Marés e colheitas

A Lua também influencia a rotina de pessoas ao redor do mundo, como no caso das marés que variam conforme o movimento orbital lunar.

“As fases da Lua influenciam as marés em razão da mudança da sua proximidade com a Terra”, explica Jung.

A força gravitacional da Lua provoca oscilações no nível da água do mar e, assim, dita a vida de pescadores, moradores de áreas litorâneas e também turistas.

Em um momento em que se discutem a redução de poluentes e o controle da temperatura global, essa movimentação das águas do mar é vista como uma alternativa para produzir energia elétrica com baixo impacto ambiental e estudada para que se entenda a sua importância na regulação do clima.

Os agricultores também tiveram sua rotina influenciada pelas fases da Lua. Os momentos de plantio e de colheita eram determinados ao longo do ano de acordo com o formato com que o satélite natural da Terra surgia no céu.

“Os babilônios, por exemplo, já sabiam que os eclipses da Lua e do Sol se repetiam dentro de um ciclo de 18 em 18 anos, aproximadamente”, conta Langhi. "Esses povos usavam os movimentos, as fases e os ciclos da Lua e dos astros para organizar rituais religiosos, festividades, plantações e a própria vida.”

“Também existem pessoas que acreditam que as fases lunares estão diretamente relacionadas ao crescimento dos cabelos", diz Jung. “Outro aspecto está relacionado ao sono, que é popularmente dito como capaz de se modificar de acordo com a fase lunar.”

Apesar dessas crenças populares em relação ao corpo humano, o especialista reforça que a Lua, cientificamente, não tem efeito nenhum sobre os seus líquidos e fluidos, mesmo levando-se em conta o fato de que somos feitos de 70% de água.

A ida do homem à Lua

As primeiras viagens até a Lua ocorreram na década de 1950, durante a Guerra Fria. Na época, os Estados Unidos e a União Soviética disputavam a hegemonia na exploração do espaço, fazendo com que o interesse no satélite natural fosse muito mais político e ideológico do que até mesmo científico, ainda que muitas descobertas tenham ocorrido nesse período.

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Valentin Rakovsky, Gabriel Campelo, Anibal Maiz Caceres/AFP - 8.12.2022

Nesse contexto, foi iniciada uma competição entre as duas superpotências. Na chamada corrida espacial foram realizados lançamentos de satélites artificiais e sondas espaciais, envio de expedições tripuladas para o espaço e viagens para a Lua.

Em 1961, a URSS conseguiu colocar o primeiro homem em órbita terrestre: o cosmonauta Yuri Gagarin, a bordo da nave Vostok 1. No mesmo ano, iniciou-se o projeto americano de enviar o homem para a Lua pelo programa Apollo — nome dado em homenagem a Apolo, deus grego relacionado à colonização.

"Os soviéticos sempre estiveram à frente na corrida espacial, pois foram os primeiros a enviar um satélite artificial em órbita da Terra, um animal e um homem em órbita, e fazer uma sonda pousar eficientemente no solo da Lua. Só depois os Estados Unidos foram os primeiros a ter astronautas na Lua com a missão Apollo", conta Langhi.

O Apollo se tornou o terceiro projeto a ser desenvolvido pela agência espacial dos EUA, a então recém-criada Nasa (National Aeronautics and Space Administration), e sucedeu os programas Mercury e Gemini.

Em 1968, o programa conseguiu enviar a primeira nave tripulada, a Apollo 8, para a zona de influência da órbita da Lua. No ano seguinte, em 16 de julho, foi a vez de a nave espacial Apollo 11 ser lançada. A bordo estavam os astronautas Neil Armstrong, Edwin Aldrin e Michael Collins.

Armstrong, como comandante da missão, foi o primeiro a sair e pisar no solo lunar, no dia 20 de julho, às 23h56, no horário de Brasília. Na ocasião, o astronauta disse a famosa frase, símbolo da conquista espacial: “É um pequeno passo para um homem, um salto gigantesco para a humanidade”.

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Simon MALFATTO, Maria-Cecilia REZENDE/AFP - 24.8.2022

A missão Apollo empregou diretamente cerca de 400 mil pessoas e envolveu mais de 20 mil indústrias e universidades americanas. Além disso, na época, foram gastos cerca de 24 bilhões de dólares (R$ 122,8 bilhões).

Desse modo, após a última viagem do programa que levou um total de 12 homens para caminhar na Lua até 1972, tanto os Estados Unidos como a União Soviética já estavam esgotados financeiramente e o cenário mundial não favorecia mais a aplicação de capital para a realização de grandes e caras missões espaciais.

Programa Artemis

Nos últimos anos, a exploração do espaço entrou em uma nova fase na qual grandes empresas particulares fundadas por empresários bilionários buscam desenvolver foguetes e cápsulas tripuladas. Com o investimento alto nesse setor, o ser humano volta a sonhar em pisar na Lua.

O projeto Artemis — nome dado em homenagem ao programa Apollo, pois Ártemis e Apolo são irmãos na mitologia grega — é uma parceria entre a Nasa, agência espacial americana, e a SpaceX, empresa criada por Elon Musk que tem como objetivo aprofundar as pesquisas a respeito do nosso satélite natural e do Sistema Solar.

“O programa Artemis será pioneiro ao colocar a primeira mulher e a primeira pessoa negra na superfície lunar”, conta Jung.

Os cientistas planejam fixar uma base na Lua e desenvolver tecnologias, sistemas e espaçonaves para ir até Marte. Outro objetivo é aumentar o tempo de permanência dos astronautas no espaço — como parte da preparação para missões tripuladas de longa duração.

“Recentemente testemunhamos o sucesso da ida da nave Orion da missão Artemis ao circundar a Lua e retornar em segurança à Terra”, relata Langhi sobre a primeira etapa do projeto, a missão Artemis 1, concluída em 11 de dezembro de 2022.

Um vídeo da AFP mostra como foi o planejamento da missão, que falhou diversas vezes antes de ser bem-sucedida.

A segunda fase do programa está prevista para 2024 e tem como objetivo a observação do funcionamento dos sistemas em uma viagem tripulada que realizará um sobrevoo na Lua.

Por fim, a terceira e última etapa será a mais longa e possivelmente contínua, na qual ocorrerão o tão esperado retorno dos seres humanos à superfície lunar e a ampliação dos estudos a respeito do satélite, com a possibilidade da obtenção de recursos para a produção de combustíveis para foguetes.

O Brasil é um dos países signatários do Acordo Artemis, que estabelece os princípios para a exploração espacial de forma pacífica e sustentável.

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Simon Malfatto, Valentina Breschi, Sophie Ramis, Maria-Cecilia Rezende, Patricio Arana/AFP - 6.12.2022
Gasto ou investimento?

Diferentemente do que muitas pessoas imaginam, a Lua e o setor espacial são um investimento lucrativo e com a possibilidade de grande retorno financeiro. A exploração espacial, de maneira geral, é responsável por importantes avanços tecnológicos, com reflexos na vida de pessoas por todo o planeta.

“A ida do homem à Lua por meio das missões Apollo trouxe muitos impactos para a humanidade, por exemplo, novas normas de segurança alimentar, tecnologias para controles digitais de naves e aviões, amortecedores para terremotos e isolamento térmico”, comenta Jung.

Langhi também rebate as críticas de que as missões espaciais são um investimento muito alto e que o dinheiro desembolsado poderia ser utilizado para questões humanitárias.  

“Podemos destacar que alguns filmes e grandes produções cinematográficas, por exemplo, gastaram mais dinheiro do que missões espaciais”, afirma o professor.

E se a Lua não existisse?

Sem seu brilho lá no céu, mais do que não existir a inspiração para o pagode mais tocado em 2011, não existiriam as características necessárias para os humanos viverem na Terra.

O astrônomo da Unesp explica que, sem a Lua, o planeta Terra giraria mais rápido. “Sabemos hoje que o período de rotação da Terra era menor muito tempo atrás, ou seja, o nosso planeta girava mais rápido em torno do seu eixo de rotação”, diz o especialista. “Graças aos efeitos de maré causados pela Lua sobre a Terra, a rotação do nosso planeta e a da Lua foram diminuindo bem lentamente, até chegar ao ponto em que a Lua atualmente está num estado de equilíbrio, ficando sempre com a mesma face virada para a Terra.”

Além disso, o clima do planeta seria completamente diferente. “Se a Lua não existisse, os cálculos mostram que isso desestabilizaria totalmente o eixo de rotação da Terra, fazendo com que sua inclinação atual de 23,5 graus se alterasse drasticamente e "rapidamente" (em termos astronômicos), modificando totalmente o clima do planeta, derretendo as calotas polares e alterando todo o equilíbrio climático”, completa Langhi. “A Terra seria como um pião rodando mas perdendo seu equilíbrio, tombando e levantando a todo momento.”

A ideia de não existir mais o brilho do luar é algo que deve acontecer em um futuro muito distante. Enquanto isso, o astro que ilumina os apaixonados e inspira os compositores continua fascinando leigos e cientistas e movimentando a exploração do espaço.

*Estagiária do R7, sob supervisão de Pablo Marques


Reportagem: Maria Cunha
Edição: Pablo Marques